A comerciante Iraci de Souza, 60 anos, tem hora marcada para tomar banho – entrar no chuveiro só de manhã bem cedo ou no período da noite. Durante o dia, com o sol a pino, nem pensar. “A gente entra e a água tá pegando fogo. Tem que deixar para tomar banho em uma hora mais fresca”, conta. Iraci mora em Bom Jesus da Lapa, no Oeste do estado, uma das quatro cidades baianas que registraram temperaturas acima de 40 °C nas últimas duas semanas.
Segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), no último dia 5, os termômetros chegaram a registrar 41,3 °C na cidade. No dia anterior, o calor também foi grande em Ibotirama e Santa Rita de Cássia, ambas atingindo 40,8 °C . Uma semana antes, no dia 26 de setembro, Carinhanha sofria sob o calor de 40,2 °C . “Está todo mundo queimado do sol por aqui. O pessoal usa blusa de manga comprida e sombrinha para se proteger do sol”, comenta Iraci.
Outras cidades do Oeste também têm registrado calor excessivo nos últimos dias: Correntina, Barreiras, Buritirama e Barra tiveram máximas acima de 39 °C no dia 4.
Foto: Arte Correio* |
Motivos
Uma série de fatores contribui para que o Oeste baiano tenha temperaturas elevadas entre setembro e outubro, época do ano que antecede o período de chuvas no local, que vai de novembro até abril. Por estar afastada do mar, a região apresenta baixos índices de umidade atmosférica, o que influencia na formação de nuvens e no equilíbrio térmico.
“Aquela região é um local onde não há influências do litoral, então, o clima fica bastante seco, com baixa umidade no ar. Sem isso, não há muita formação de nuvens, o que ajuda na elevação da temperatura”, explica Cláudia Valéria, meteorologista do Inmet.
Heráclio Alves, meteorologista do Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos da Bahia (Inema), conta que, no Oeste, esse é o período mais seco do ano. “Não há nebulosidade naquela região, o que faz com que as temperaturas já aumentem. Isso, associado à atuação frequente das massas de ar seco, contribui para que se registrem as altas temperaturas”, acrescenta.
O relevo e a vegetação da região, onde predomina o cerrado, também ajudam a esquentar o clima. “Nessa área, chove até, pelo menos, março ou abril. A partir daí, a vegetação fica bastante rasteira e durante o período seco ela praticamente não existe. O solo nu nas extensas áreas planas, onde há uma maior incidência de radiação solar, contribui para aumentar a temperatura”.
Sensação
Apesar de se tratar de um fenômeno comum nessas cidades, a impressão dos moradores é de que o calor se agravou nos últimos anos. “O sol chega a cozinhar a gente. Sempre fez calor por aqui, mas nos últimos anos parece que ficou mais quente”, diz a auxiliar de escritório Vilma de Oliveira, 24, de Santa Rita de Cássia.
Segundo Heráclio, a impressão da população se deve ao encurtamento do período das chuvas, que esse ano acabou em fevereiro, dois meses antes do normal. “Em 2015, como o período de chuva terminou mais cedo, o período de estiagem foi maior. Mas não temos esse histórico de que a temperatura vem crescendo. Ela se mantém estável nos últimos cinco anos”, aponta.
Consequências
Além do calor, a alta nos termômetros traz desdobramentos maiores, como crescimento no consumo de energia elétrica e água, prejuízos à agricultura e pecuária e aumento no número de queimadas.
“Essa temperatura alta tem diversas influências negativas. A maior delas é o alto consumo de água, que já é escassa na região. A população tem perfurado muitos poços artesianos nos últimos anos, mas temos notado que a vazão deles já está diminuindo”, conta José Rodrigues, secretário da Agricultura, Recursos Hídricos e Meio Ambiente de Ibotirama. Segundo ele, por conta da estiagem e calor, o rebanho de gado da cidade passou de 25 mil para 15 mil em cinco anos.
Na zona rural, o clima seco tem prejudicado também as plantações. “Nossa agricultura aqui é de subsistência: a gente planta com a chuva. Hoje, a gente só vê tudo seco no lugar onde antes tinha plantação”, conta o secretário.
Na casa onde mora com o marido, em Bom Jesus da Lapa, a comerciante Iraci viu a conta de energia subir junto com a temperatura. De R$ 110, valor que costumava pagar antes da alta do calor, passou para R$ 250 por mês, em média. “A gente dorme com o ar condicionado ligado porque o ventilador não adianta mais”, justifica.
Duas das quatro cidades que têm enfrentado máximas acima de 40 °C estão em situação de emergência, por conta da estiagem prolongada.
Focos de calor
O tempo seco também contribui para o aumento no número de queimadas na região. Do início de agosto até a última quinta-feira, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) registrou 2.710 focos de calor na área afetada. “Além das altas temperaturas e da ação de caçadores e agricultores, o bioma cerrado agiliza o processo, já que muitas espécies precisam dos incêndios para florir, então, os focos de incêndio acabam ocorrendo mais rápido”, conta Fabíola Cotrin, coordenadora do programa Bahia sem Fogo. Mais de 70 pessoas, entre técnicos do Inema/Sema, bombeiros e brigadistas voluntários atuam no combate aos incêndios através do programa.
Segundo Heráclio, o período de chuvas deve começar em breve, a partir da segunda quinzena deste mês. “Quando as frentes frias do Sul do país e a umidade que vem da Amazônia chegam ao mesmo tempo naquela região, somado às temperaturas altas, inicia-se o período de chuvas. Com elas, essas temperaturas ficam mais amenas”, afirma o meteorologista, para alívio de quem anda sofrendo com o calor.
Chapada e Planalto da Conquista são áreas mais frias
Enquanto a região Oeste sofre com o calor excessivo, com temperaturas acima de 40 °C , as cidades localizadas na Chapada Diamantina e no Planalto da Conquista, no Sudoeste, enfrentam uma temporada de frio, principalmente à noite. No dia 10 deste mês, a temperatura chegou a 11,8 °C em Vitória da Conquista. Na segunda-feira (5), Itiruçu registrou 15,8 °C. No domingo (11), Itaberaba marcou 16,2 ºC. Frio também na terça-feira (6) em Morro do Chapéu: 17,6 °C.
De acordo com a meteorologista Cláudia Valéria, as baixas temperaturas nessas áreas são provocadas pela altitude. “Normalmente, as menores temperaturas do estado acontecem na Chapada ou no Planalto da Conquista ao longo do ano. As temperaturas ficam mais baixas por conta da altitude dessas cidades, que é bem acima do nível médio do mar”, explicou.
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