Hoje a inteligência artificial (IA) responde a tudo com requinte de detalhes. Certa vez, fui escrever um e-mail importante. Consultei a IA para cada palavra, cada tom, cada vírgula. O resultado foi impecável, mas, ao enviar, percebi algo estranho em mim. Aquela mensagem não era inteiramente minha.

E essa situação não acontece só com e-mails. Quantas vezes revisamos mensagens no WhatsApp, ajustamos posts em redes sociais, montamos relatórios ou apresentações seguindo instruções de sistemas ou conselhos de terceiros, e sentimos que perdemos nossa própria voz? A sensação de que algo genuinamente nosso está ausente é sutil, mas persistente. Até mesmo nas tarefas mais simples, começamos a depender de soluções externas para nos proteger da dúvida e da angústia de decidir.
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É nesse ponto que percebemos algo importante: quanto mais buscamos respostas prontas, mais nos afastamos de nós mesmos. Queremos o jeito certo, a palavra perfeita, o e-mail impecável. E, no caminho, deixamos de sustentar o eu-não-sei, essa parte inevitável da experiência humana que nos conecta com nossos desejos, nosso estilo, nossa autenticidade. Perguntamo-nos menos: “Qual é a minha voz aqui? O que eu realmente quero dizer?” e mais: "O que alguém ou alguma máquina me diz que é melhor?".

Mais de 18 milhões de brasileiros convivem com transtornos de ansiedade. A Organização Mundial da Saúde reforça que essa é uma das questões de saúde mental mais urgentes do país. Nossa necessidade de certezas imediatas, intensificada por sistemas inteligentes, pode nos tornar dependentes de respostas externas e nos afastar do que é genuinamente nosso: a capacidade de sentir, decidir e experimentar, com erros, dúvidas e riscos.

Talvez a reflexão não seja sobre eliminar a dúvida, mas sobre percebê-la. Observar o que surge quando nos permitimos escrever, decidir ou comunicar sem depender de soluções prontas. É nesse espaço de incerteza que podemos sentir nossa voz, reconhecer nossos desejos e agir de forma mais autêntica.

E você? Quantas decisões da sua vida são realmente suas, e quantas você deixou que respostas prontas, de pessoas ou de máquinas, decidam por você?

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