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Carla Freitas tem a meta de virar árbitra do UFC |
Carla Freitas é uma das expoentes das artes marciais na Bahia. Na Bahia e no Brasil. O currículo dispensa comentários: bicampeã brasileira de boxe, bicampeã brasileira de Jiu-jitsu e um vice-mundial, além de dezenas de outros títulos e participações em competições internacionais de alto rendimento. Hoje, aos 32 anos, ela se aperfeiçoa em novos caminhos: árbitra de MMA. Isso ao mesmo tempo em que dá aulas em academia, é Personal Trainer e se prepara também para retornar as competições de boxe após longo período parada por conta de lesões.Carla Freitas vai arbitrar no Imperium MMA PRO III, evento marcado para começar às 20h de sábado (27), no espaço Realle, em Pituaçu. Ela está nesta atividade desde 2007 e está, atualmente entre as três principais mulheres do Brasil na função. Segundo suas estimativas, trabalhou em mais de 50 eventos desde então. Agora ela conta ao
iBahia Esportes suas experiências no MMA, os bastidores e por que pretende continuar apenas como lutadores de boxe. Curitibana radicada em Salvador, Carla Freitas fala também como o esporte serviu de trampolim para que ela saísse de uma fase depressiva, da ascensão do MMA feminino, assédio e seus planos para o futuro.
Qual a sua história no esporte?Eu venho do boxe, faço parte da academia Champion (de Luiz Dórea). Comecei em 1998, já tenho um bom tempo aí. Sou bicampeã brasileira de boxe, fui para um Panamericano, no Equador. Jiu-jitsu eu sou faixa azul. Já fui bicampeã brasileira de jiu-jitsu. Participei do Mundial e fiquei em segundo lugar. Então eu amo arte marcial, é meu esporte. Eu sou de Curitiba. Quando vim para Salvador eu descobri o jiu-jitsu. Aí, logo depois veio o boxe, com Dórea. Até hoje eu estou aí. Hoje eu tenho apoio da minha família, mas antes não tinha. Quase matei meu pai do coração logo no início. Mas hoje eles respeitam. Meu quarto é cheio de luvas, medalhas, é a minha vida. Não posso deixar de acreditar nas coisas.
Por que boxe? Por que jiu-jitsu?Quando vim para Salvador, na bagagem dos meus pais, senti muita diferença. Salvador é diferente de Curitiba. Senti o clima, senti a diferença e tive depressão. Aí veio o boxe. Comecei a extravasar aquela energia. Em 1998 fiz minha primeira luta no Balbininho, na preliminar de Hollyfield. Ganhei e disse a mim mesmo: "gostei disso". O estádio estava cheio, muita gente. Gostei da experiência. Daí que as artes marciais começaram em minha vida. Hoje meu nome, o que eu sou, vem das artes marciais.
Já pensou em lutar MMA?As pessoas me falam: "por que você não entra? Você já tem muito tempo." Não penso. Eu tenho uma profissão também, sou professora de educação física, sou personal trainer, professora de boxe. Para lutar MMA, eu precisaria me dedicar muito aos treinos. Dedicação de várias esportes. O patrocínio para bancar tudo isso é difícil. Eu vejo como os atletas sofrem. Eu mesmo sofro. Eu prefico ficar como árbitra.
Como você se tornou árbitra?Desde 2007 eu estou arbitrando. Comecei num evento em Campo Formoso. Crocotá (Edilberto Crocotá, baiano, ex-UFC) me convidou e eu gostei. Novembro de 1997. Rogério Minotouro, Cigano, Velame, foi uma turma muito grande que estava lá. Houve uma grande repercussão. Em setembro, arbitrei de 1997 também trabalhei no Prime e estou aí desde então. E promessa de UFC, claro.
Você é mulher em um esporte que predonima homens. Lida bem com isso?Tem um certo preconceito. Mas eu não sei até que ponto é preconceito ou costume de não ter muita mulher dentro do octógono. Como estou há muito tempo eles têm um respeito. Eles sabem que tem aquela diferença. Mulher é muito mais perfeccionista. Eu entrei naquela hora, a luta é A e B para mim. Não tem preferência. Conheço tudo mundo, mas não tem preferência. É a regra e eles sabem disso.
Tem muito assédio?Acho que não, não vejo isso. Ou eu não consigo enxergar porque levo muito para o profissional. Mas eu não vejo assim.
Como você se enxerga daqui a algum tempo? Como está sua preparação hoje?Existem três árbitras no Brasil que estão bem posicionadas. Eu e mais duas. Elas também estão em evidência. NO TUF, como agora entrou o duelo entre as meninas (TUF 18, nos EUA, com mulheres e homens), rolou essa campanha. Só temos uma árbitra mulher no UFC. As coisas estão acontecendo. Tive apoio desde 2007 dos amigos. Estou fechando para fazer um curso com Mário Yamakasi, árbitro do UFC. A gente está fechando para ele vir para cá. Eu estou correndo atrás e tenho grandes intenções de chegar lá no UFC.
Em quem você se espelha?Gosto muito do Mário Yamakasi, mas me espelho muito em que me deu apoio: Carlão Barreto e Borracha. Eu não vejo a luta, eu vejo eles. Vejo a posição, a base das regras, tudo. Ali que eu estou aprendendo. (Carlão Barreto é lutador de jiu-jitsu, árbitro de MMA e comentarista do canal Combate; Paulo Boracha é lutador de artes marciais, árbitro e comentarista)
As sensações, dentro do octógono, é a mesma para lutadores e o árbitro?Como árbitro, a gente também sofre porque existe um vencedor e um perdedor. O cara que perde não gosta e o árbitro tem autoridade para acabar a luta na hora certa. Isto é uma responsabilidade muito grande e gera tensão também. Precisamos ser frios naquela hora. Você tem que estar ali concentrado. Vem muito de ser atleta. A gente tem que ter um ouvido diferente para não ter a influência do público.
É difícil lidar com os lutadores em um momento tão tenso?É muito importante o árbitro ter sido atleta, ter tido essa experiência. Porque você sabe qual é a hora de uma atleta estar no seu limite ou se ele está mentindo. Muitos atletas fazem a farsa para impressionar o juiz. O árbitro tem que saber disso. Há momentos que a gente precisa prevenir o atleta, porque ele está no limite. Quem está de fora às vezes não vê. É importante ter essa noção para intervir na hora certa. Muitos atletas recebem um golpe e tentam mascarar pedindo tempo para descansar porque eles estão cansados. Tem isso de enrolar. O árbitro tem que estar atento a isso. A gente passa nos vestiários e diz: "não deixe na mão do árbitro". Não fica bonito para ele, nem para o evento, nem para a própria luta.
Quantas lutas você já arbitrou? Não sei. Tentei contar isso porque sabia que alguém um dia ia me perguntar. Acho que umas 50. Hoje a média é um a cada 15 dias. No Iron Fight, recentemente, foi a primeira luta feminina que arbitrei em todo esse tempo. Foi em Feira de Santana.
Como é a preparação antes das lutas?
Eu já sei como funciona, mas sempre dou uma olhada nas regras. Faço uma concentração e procuro saber quem são os atletas, para saber o estilo. Para saber mais ou menos o que pode acontecer no octógono. Às vezes é uma equipe polêmica e temos que ter uma posição diferente.
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Carla Freitas é bicampeão no boxe e também no jiu-jitsu |
Você ainda compete ou só arbitra?Dei uma parada porque tive lesão no joelho e no ombro. Mas estou de volta aos treinos. Há três anos que eu tento, mas meu ombro não deixa. Agora estou sentindo mais confiança e vou tentar no campeonato mundial, que é a minha meta. Dá para conciliar com o trabalho de arbitragem numa boa. É bom porque eu já estou envolvida.
O MMA feminino está em ascensão. Como você enxerga este momento?
O UFC está aí mostrando que elas têm potencial. Já vai ter o TUF 18, que foi o evento que fizeram campanha para eu ser árbitra. Eu não sei como vai ser, o pré-requisito...Serão duas técnicas e a equipe feminina junto com a masculina. Porque não tem tantas mulheres. Nisso aí vai ter o TUF Brasil com certeza. Nós temos a baiana Amanda Nunes, que já está aí contratada pelo UFC. E temos outras aí na porta. Índia, Ana Maria, Duda Yankovich, que já passou pela Champion. Eu falo para as meninas: "não desiste". Vai sempre ter obstáculos, vai sempre ter pedras.
Fora a arbitragem, como está sua vida?
Eu trabalho em duas academias dando aula de boxe. Sou personal de boxe. Tenho várias meninas, mulheres e senhoras. E homens, claro. São as duas que estou há mais tempo. Já trabalhei em mais dez academias e agora não quero mais academia. Decidi ser Personal Trainer somente. Porque os horários são mais flexíveis. Dá tempo para treinar. Preciso ter essa flexibilidade. E financeiramente também é melhor.