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SALVADOR

Comércio fervilha na Barroquinha

Cultura do couro, vai e vem de transeuntes e muita agitação. Esse é o dia a dia da Barroquinha, um dos locais mais tradicionais de Salvador, que merece ser conhecido

• 15/03/2011 às 15:47 • Atualizada em 27/08/2022 às 8:52 - há XX semanas

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Do iBahia por: Márcia Luz

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Não é bem um bairro, mas a Barroquinha pode ser considerada um
universo muito particular em Salvador. Só por isso já vale uma visita ao
local, um dos mais antigos e movimentados do comércio em Salvador.
Tudo por lá é muito peculiar e o mais interessante é que a rua é, de
fato, o palco para todas as coisas. Mesmo as lojas de roupas, em sua
maior parte feminina, não se contentam em seus limites e colocam ofertas
e manequins na porta. É o carrinho de café e de mingau, é o cara com o
megafone anunciando as promoções, são as barracas, os ambulantes… O lixo
e o luxo do popular enfeitam a rua.

Barroquinha é também paradoxal. De dia é puro movimento, de noite é
deserto. A rua vira dormitório, ponto de drogas e banheiro público,
perigoso até e bem diferente do vai e vem colorido que preenche o dia. O
mais interessante é que as coisas dividem espaço, se sobrepõem. Não é
uma coisa ou outra, é tudo ao mesmo tempo. Tem cheiro (muitas vezes
desagradável), tem som (das pessoas se comunicando ou da música gospel
em ritmo de forró que alegra o interior das lojas), tem visual (colorido
das roupas, das bandeirolas, das barracas e fachadas), ou seja, a
estética é multi, complexa, exagerada, popular e, por isso mesmo, tão
baiana e tradicional.

Tradição do couro - Não tem
outro lugar em Salvador no qual o comércio do couro seja tão forte
quanto na Barroquinha. São 20 barracas instaladas no local, vendendo
bolsas, sapatos, sacolas de viagem, tapetes e uma infinidade de artigos.
O mais importante é que isso representa a tradição artesanal do
negócio. Todas as peças são feitas por trabalhadores em cidades do
interior e trazidas para a capital. O cheiro forte – muitas vezes até
desagradável do couro – é uma das marcas da cultura enraizada ali no
local.

Há 15 anos trabalhando no lugar, o comerciante José Miranda comenta
que sempre procura oferecer à sua clientela produtos diferenciados.
Assim, ganha a fidelidade dos compradores e dribla a concorrência. Suas
peças são trazidas de cidades como Jequié e Jorro.

Outro comerciante, Jucelino Nery Conceição, diz que trabalhar no
local é bom, mas os vendedores precisam de mais assistência por parte da
prefeitura. Suas barracas disputam espaço com lixo. Além disso, a
segurança é outro ponto que deve ser reforçado. “Também já enviamos um
memorando para a prefeitura, pedindo que a Barroquinha seja incluída no
roteiro turístico da cidade. Afinal de contas, esta é a maior área
coureira do Norte-Nordeste”, afirma ele.

Além de resistentes, as peças em couro são baratas. Pelo menos, na
Barroquinha! Uma sandália rasteira, por exemplo, pode sair por apenas R$
20. Se o modelo for infantil pode custar até R$ 10 e, se a conversa for
boa, tem descontos. A peça mais cara entre as barracas chega aos R$
150, uma bolsa de viagem. Dizem os vendedores que com o tempo e o uso, o
cheiro forte do couro deixa de existir. É experimentar para ver!

Lailane e Leilane

Personagens do cotidiano - Elas são irmãs, mas não são gêmeas,
embora muito parecidas. As meninas Laiane e Leilane, de 18 e 15 anos,
respectivamente são frequentadoras assíduas da Barroquinha. Quando
pensam em comprar roupas, que shopping que nada! Elas gostam mesmo é das
lojas de rua, nas quais entram e saem sem pagar pela beleza dos grandes
centros de compras.

Elas moram em Sussuarana, enfrentam ônibus, mas querem pesquisar os
preços e poder escolher suas aquisições entre os jeans do movimentado
comércio local. “Passamos para pesquisar os preços. Aqui está meio
acabadinho, mas tá bom”, dizem. O visual das duas é muito parecido! O
penteado é o mesmo, mas elas mudam apenas de lado. Bem-humoradas e até
um pouco tímidas, seguem estilos bem parecidos também no modo de vestir:
o jeans é a base dos looks.

Uma vida na Barroquinha - Jucelino
Nery Conceição é comerciante de couro e há 36 anos vive na Barroquinha.
Morar, morar, ele não mora, mas como passa mais horas do seu dia no
lugar do que em casa, já considera-se “cidadão da Barroquinha”. Ele
conta que seu maior prazer é trabalhar ali, atendendo turistas e
soteropolitanos, de segunda a sábado, das 8h às 18h. Ali já viu muita
coisa e, claro, fez amigos. Histórias para contar é o que não lhe
faltam.

“Quando cheguei aqui em 1974, ainda não tinha a escada. O calçadão
também não. Existiam apenas três barracas, eram duas de couro e uma de
bijuteria. Depois o comércio foi crescendo e agora são 20 barracas”,
salienta o vendedor. Ao longo dos anos em que está na Barroquinha, o
episódio mais triste e difícil que viu até agora foi o incêndio da
igrejinha, onde hoje funciona o Centro Cultural Barroquinha. Passados
anos, ficou, porém, uma história engraçada: “Até 1986 quando a igreja
pegou fogo, alguns camelôs guardavam as coisas no lugar. Um deles era
muito católico e toda noite se ajoelhava lá para rezar, mas depois que o
fogo destruiu tudo que ele tinha, virou evangélico e hoje vive no
bairro de São Caetano. Eu nunca tive vontade de sair daqui. Já estou
aposentado, mas quero ficar aqui até quando der”.



Megafone -
Definitivamente, não
é tarefa fácil levar clientes para dentro das lojas em uma rua
comercial onde os estabelecimentos oferecem produtos bem parecidos. A
guerra pelo cliente é grande e vale tudo. Quem mais se destaca, vende
mais. Com o megafone na mão, frases de efeito na ponta da língua cabe a
Rafael Santana anunciar a plenos pulmões as ofertas da Marivan Moda. “Lugar
de comprar barato é aqui na Marivan Modas”
, divulga. A vergonha,
segundo ele, ainda tem, mas como precisa trabalhar, dá um jeito de
esquecer essa parte e desempenhar bem sua função. E dá certo, viu? Só
tem um probleminha: bem em cima da Marivan Modas existe um hotel. Isso
mesmo! Imagine alguém hospedado em um hotel da Barroquinha e acordar
sábado de manhã com o Rafael e seu megafone convocando os transeuntes a
comprar barato na loja? No mínimo, inusitado!

Ruas degradadas - Bem ali no
coração do Centro Histórico de Salvador, um local cheio de história,
está a degradação instalada na Barroquinha. Quem passa ou trabalha no
local tem convive diariamente com lixo, pobreza, ruas cheias de buracos,
mendigos, enfim, com a degradação física, arquitetônica e até humana,
como um homem que dorme caido no chão, embaixo do sol e de um aviso:
Proibido jogar lixo! O mais impressionante é que a situação já é tão
arraigada e cotidiana, que as pessoas que passam de um lado para o outro
parecem não enxergar mais o que está bem ali na frente. É preciso ter
cuidado para andar pela Barroquinha e suas proximidades, pois as pedras
soltas desintegram as calçadas, mas nada é feito. Nenhum sinal de
recuperação ou presença de representantes da prefeitura no lugar. Nada
que sinalize alguma possibilidade de recuperação!

Além da estética degradada, o cheiro do local não é nada agradável.
Se durante o dia o movimentoé intenso, à noite a Barroquinha é deserta e
seus cantos servem de “banheiro público”. O fedor de urina é
impregnado, insuportável mesmo! Em dias de chuva, a situação pode piorar
bastante, pois o lixo vira lama. Aí, só muita coragem para pisar por
lá.

Edificações - Atrás da antiga Igreja da Barroquinha e na
esquina com a rua Visconde de Itaparica estão os restos arquitetônicos
da que foi, talvez, a edificação mais imponente da Barroquinha: o
casarão de número 8, que abrigou o Hotel Castro Alves. As informações
mais recentes sobre o local são do ano de 2008, quando o casarão desabou
no dia 24 de abril. Hoje ainda estão erguidas as paredes da fachada e
da lateral, mas o imóvel, que pertenceu à antiga Associação de Caxeiros
Viajantes da Bahia, foi condenado e interditado pela Superintendência de
Controle e Ordenamento do Uso do Solo do Município de Salvador (Sucom).

Moda - A rua é palco para tudo
na Barroquinha. A prova disso é que as lojas extrapolam os limites dos
estabelecimentos e ganham a rua. Os manequins são expostos, assim como
os balaios de promoções. Os vendedores também chamam as pessoas que vão
passando para entrar e aproveitar as promoções. Os looks exibidos nos
manequins não são exatamente o que há de mais atualizado, na visão de um
fashionista louco por grifes, mas são bem em conta e satisfazem o
público. Já os balaios são o que há, além do preço baixo, é uma forma
democrática de os compradores tocarem nas peças e avaliarem se o produto
vale a promoção.



Castro Alves - A Barroquinha
está entre dois pontos importantes do Centro Histórico: na parte de
cima está a Praça Castro Alves e na parte de baixo, a Baixa dos
Sapateiros. A Castro Alves é uma das mais famosas de Salvador, vigiada
pelo próprio poeta. Ali está o antigo cinema Glauber Rocha, que ganhou
reformas e hoje abriga o Espaço Unibanco de Cinema, lugar frequentado
pelo público cult da cidade. Durante anos, a praça foi palco do ponto
alto do Carnaval baiano: o encontro de trios, liderado por Dodô &
Osmar. Não era apenas a despedida da festa, mas o momento das
homenagens, a confraternização entre os artistas, a consagração da
guitarra baiana e a reunião de todos os foliões, na manhã da
Quarta-feira de Cinzas. O antigo cinema Glauber Rocha virou o Espaço
Unibanco de cinema com vista privilegiada para Baía de Todos os Santos,
café, livraria e filmes de arte.

Baixa dos Sapateiros - Descendo
a Barroquinha, passando pelo terminal, chegamos à Baixa dos Sapateiros,
nome “artístico” da avenida JJ. Seabra, que ficou conhecida depois de
ser homenageada com a letra do mineiro Ary Barroso. O comércio é
movimentado e apesar das muitas promessas de revitalização do lugar,
quem circula por lá esbarra dia após dia na falta de conservação. Lá
está instalado o Quartel do Corpo de Bombeiros, que todo 8 de dezembro
fica em festa para celebrar sua padroeira: Santa Bárbara. Foi ali que o
engenheiro Ramo de Queiroz instalou os primeiros trilhos dos bondes da
Linha Circular de Carris da Bahia, para facilitar a vida dos
trabalhadores do Cais do Porto no Comércio, que subiam a Balança do
Taboão e se dirigiam da Baixa dos Sapateiros ao Bonfim.




Anúncios - Desbloqueio e venda de aparelhos celulares,
reformas de roupas e até venda de um prédio e do remédio à base de raiz
da Amazônia para curar problemas na próstata… Tudo é anunciado da
maneira mais desordenada possível com cartazes e placas colados ou
pendurados em paredes e muros. É interessante notar, ainda, como os
lugares ganham novas funções. Por exemplo: a loja de roupa,
momentaneamente, perde sua primeira função que é vender roupa para
servir de suporte para o anúncio da venda do prédio. Na porta do
estabelecimento é a primeira mensagem percebida por quem chega ou passa
em frente.

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