A única derrota de João Henrique (PP) na Câmara de Salvador, em oito anos de governo, poderá lhe custar o ostracismo político por outros oito anos. Ela ocorreu na madrugada de ontem, em uma votação secreta. Precisava do apoio de 28 dos 41 vereadores para reverter a rejeição de suas contas de 2009, pedida pelo Tribunal de Contas dos Municípios (TCM). Acabou derrotado, já que teve apenas 25 votos a favor. Como tem em sua base governista 31 membros, seis deles foram infiéis. Com base na Lei da Ficha Limpa, João está automaticamente inelegível, proibido de disputar eleições por oito anos, contados a partir de ontem. Se não conseguir reverter na Justiça, abandonará a prefeitura em 1º de janeiro e não poderá disputar eleições até 2022, já que a disputa de 2020, fim do prazo de proibição, ocorre em outubro, mas a inelegibilidade só acaba em dezembro A sessão que votou as contas de João começou às 15h de quarta-feira. Mobilizou a imprensa e manifestantes, que se dividiam entre as claques de apoio ao prefeito e a dos que pediam a cabeça dele. A polêmica que varou a madrugada, todavia, não foi o destino político de João, mas projetos que estavam na pauta de votações. Se à tarde os apoiadores de João ainda duvidavam da rejeição das contas, esta foi se diluindo à medida em que as horas avançavam e os projetos iam sendo aprovados. “Quando começou a sessão, não tinha certeza, mas a partir do momento que aprovamos cinco projetos (do prefeito), todos unidos até aquela hora, tive certeza de que poderíamos aprovar as contas”, admitiu o líder governista, Téo Senna (PTC). A oposição, por sua vez, sentiu o baque da fidelidade dos governistas. Por volta das 23h de quarta, percebeu que continuar obstruindo a votação não impediria que eles fossem aprovados naquela sessão ou até no dia seguinte. Decidiu dispensar a discussão, apenas votando pela reprovação. A estratégia era aproveitar o plenário ainda cheio para pôr logo as contas em jogo. A manobra deu certo. Por volta de 0h40, a urna de prata que recolhe as cédulas em votações secretas foi colocada sobre a mesa. Às 2h, a contagem foi encerrada: 25 votos pela aprovação, 15 contra e uma abstenção – Gilberto José (PDT), que saiu do plenário. Pelo regimento da Câmara, para reverter parecer do TCM, eram necessários dois terços do plenário – 28 vereadores.
“Sinceramente, eu até agora não consigo pensar no que aconteceu”, reconheceu Senna, ontem à tarde. Logo após a derrota, ainda tentou uma cartada final, acusando os vereadores Gilmar Santiago (PT) e Aladilce Souza (PCdoB) de terem filmado as próprias cédulas eleitorais, o que violaria a confidenciabilidade da votação. Pediu a anulação do resultado. Foi vencido mais uma vez. O líder, então, ordenou que a bancada se retirasse do plenário para derrubar a sessão por falta de quorum, a fim de que não fossem votadas as contas de 2010. “Resolvemos não arriscar a de 2010. Agora, cabe ao prefeito dizer o que deve ser feito”, disse. Segundo Senna, a matéria só irá a votação, semana que vem, se houver anuência de João, que foi avisado do resultado por um curto telefonema de um de seus aliados. InfiéisEm uma análise pós-derrota, o vereador Téo Senna reconhece como erro estratégico ter deixado as contas para serem votadas após a eleição. “Eu, inclusive, lutei muito para que fossem avaliadas antes. Ele teria mandato, agora não vai ter”, disse, referindo-se à perda de poder político devido à proximidade do fim de seu governo. Segundo o líder, muitos dos vereadores que perderam as eleições atribuem o fracasso nas urnas a alegada falta de atenção do prefeito. “Tem muita gente descontente, porque perdeu a eleição, porque acha que o prefeito não resolveu problemas dele”, ponderou. E, em uma legislatura em que mais da metade dos vereadores não conseguiu se reeleger, os votos dos derrotados nas urnas foram provavelmente os que geraram uma das poucas decisões da Câmara com repercussão popular positiva nos últimos quatro anos, já que o prefeito sofre com altos índices de rejeição em pesquisas de opinião. A comemoração, todavia, ficou prejudicada com o tumultuado processo de votação, na mesma sessão, de projetos para lá de polêmicos. Prefeito quer anular decisãoEm nota enviada à imprensa, o prefeito João Henrique diz não ter desistido de disputar a eleição ao governo do estado em 2014. Ele aposta na Justiça comum para anular sua inelegibilidade, segundo ele, porque compreende não haver “dolo, má-fé ou improbidade” nas irregularidades apontadas pelo TCM. O prefeito atribuiu a derrota na Câmara a adversários políticos. “A votação foi o desfecho de uma articulação política, ocorrida diante dos olhos de toda a opinião pública, orquestrada por segmentos que temem enfrentar o atual prefeito de Salvador nas eleições de 2014”, afirmou em nota. Seu advogado, Celso Castro, diz que a Lei da Ficha Limpa, em seu artigo 2º, retira o direito de candidatar-se apenas de quem teve contas reprovadas “por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa”. Para a promotora Rita Tourinho, porém, há um inquérito em andamento no Ministério Público Estadual que avalia “existir corresponsabilização do prefeito por improbidade”, porque “foi rompido o princípio da eficiência na gestão administrativa”. Já Castro adiantou que questionará na Justiça a legalidade da votação na Câmara. Segundo ele, o prefeito deveria ter sido notificado até 48 horas antes da apreciação, para exercer o direito de defesa. Em 2009, João teve as contas rejeitadas, entre outras coisas, porque gastou mais (R$ 2,9 bilhões) do que arrecadou (R$ 2,7 bilhões), não cumpriu a exigência legal de aplicar 25% do Orçamento em educação, gastou R$ 1,3 milhão com juros e multas de contas atrasadas, além de gastar R$ 40 milhões em contratos com dispensa de licitação questionada pelo TCM. Os conselheiros consideraram irregular ainda a não cobrança dos devedores da prefeitura, que conseguiu arrecadar R$ 76 milhões dos R$ 6,5 bilhões em créditos que possuía, na época. Entre os devedores estavam vereadores e o próprio João: devia R$ 13,5 mil em multas e R$ 189 mil em ressarcimentos aos cofres públicos, por irregularidades em contas anteriores. Como acha que não cometeu improbidade, João continua sonhando com o Palácio de Ondina: “Depois de uma bem sucedida atuação parlamentar, me elegi prefeito e me reelegi. Na última campanha propagaram meu apoio ao candidato que, no final da disputa, se sagrou vitorioso. Isso mostra a nossa identidade com o povo baiano, a aceitação do nosso trabalho e nos credencia a disputar o governo em 2014 e nós seremos candidato. É a vontade do povo baiano”. Tendência de derrota antecipada pelo CorreioUma reportagem publicada na edição do CORREIO do último dia 25, a partir de levantamento feito com os vereadores, já apontava a tendência de derrota do prefeito João Henrique na Câmara de Salvador. Durante cinco dias, os repórteres Jorge Gauthier e Renato Alban questionaram os parlamentares sobre como se posicionariam na hora de votar o pedido de rejeição das contas de 2009 e 2010 feito pelo TCM, tribunal responsável por auditar as finanças dos municípios. Na ocasião, 23 vereadores anteciparam o voto, dos quais 20 revelaram posição contrária ao prefeito: Giovanni Barreto, Gilmar Santiago, Henrique Carballal, Marta Rodrigues, Moisés Rocha e Vânia Galvão (PT); Alfredo Mangueira, Sandoval Guimarães, Batista Neves e Pedrinho Pepê (PMDB); Aladilce Souza e Olívia Santana (PCdoB); Paulo Magalhães Júnior e Héber Santana (PSC); mais Orlando Palhinha (PP), Alemão (PRP), Sabá (PRB), Paulo Câmera (PSDB), Pastor Luciano (PMN) e Davi Rios (PSD). Contudo, em escrutínio secreto, apenas 15 se manifestaram contra João Henrique. Com o caráter sigiloso da votação, fica impossível determinar os que mudaram a posição manifestada à reportagem no fim de novembro. Como a vereadora Andrea Mendonça (PV), que estava no grupo dos cinco parlamentares não localizados pelo CORREIO, manifestou publicamente sua posição a favor da rejeição, é bem provável que seja maior a conta dos que alteraram o posicionamento declarado na sondagem. Apenas três anteciparam que votariam ao lado do prefeito na Câmara: o líder do governo na Casa, Téo Sena (PTC), Alan Castro e Carlos Muniz (PTN). No entanto, João recebeu 25 votos a favor. Na mesma sondagem, cinco vereadores não revelaram e outros sete se disseram indecisos. TCM rejeita contas de 2011As contas de 2011 do prefeito João Henrique foram rejeitadas ontem por unanimidade pelo Tribunal de Contas do Município (TCM). É o terceiro ano consecutivo que o prefeito cai na malha do TCM, que ainda aplicou uma multa de R$ 36 mil a João pelas irregularidades. O parecer dos auditores segue agora para o Ministério Público Estadual, que analisará as contas e definirá se irá ou não abrir ação de improbidade administrativa contra o prefeito. Os motivos da reprovação das contas de 2011 repetem as razões que levaram o TCM a rejeitar as de 2009 e 2010. Como antes, em 2011, a prefeitura não destinou à educação 25% do Orçamento, mínimo estipulado por lei. O déficit orçamentário, que tinha sido de R$ 244,8 milhões em 2010, foi de R$ 172,7 milhões no ano passado, ainda alto de acordo com o TCM. João também voltou a contratar funcionários sem concurso público, descumprindo as leis do setor. Foram R$ 51,7 milhões destinados à contração de temporários para substituir servidores do quadro. Segundo o TCM, a prefeitura ainda fechou contratos que somaram R$ 5,2 milhões com dispensa de licitação questionada e não prestou contas sobre o repasse de R$ 197,6 milhões a entidades sem fins lucrativos. Outras dez irregularidades foram apontadas pelo TCM nas finanças de João em 2011. Ainda cabe recurso da decisão. Em nota, a assessoria do TCM justificou a rejeição pela continuidade dos erros do prefeito. “A reincidência, repetidamente constatada, é que tem conduzido a Corte a rejeitar contas, na medida em que ela traduz ineficiência, ineficácia e desleixo na administração dos recursos públicos e no cumprimento da lei. Assim, não há que se falar em rigor do TCM ou na existência de boa fé de parte do gestor”. Apenas 19 vereadores que participaram da decisão relativa às finanças de 2009 se reelegeram para a próxima legislatura, de 2013 a 2016, e estarão presentes nas votações sobre as contas de 2010 e 2011. As referentes ao primeiro mandato foram todas aprovadas com ressalvas pelo TCM. Matéria original Correio 24h Defesa de João Henrique quer anular na Justiça proibição para disputar eleições em 2014
Na madrugada, JH teve contas de 2009 rejeitadas pela prefeitura |
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