|
---|
A cada 100 carros que circulam em Salvador e Região Metropolitana (RMS) nos dias úteis, 68 levam apenas uma pessoa: o próprio motorista. O dado é da pesquisa Origem e Destino da RMS, encomendada pela Secretaria de Infraestrutura do Estado (Seinfra). Além de apontar que 68% dos carros que circulam por Salvador e RMS levam somente o motorista, a pesquisa mostrou que 24,3% dos condutores dão carona a mais uma pessoa, 5,4% para duas pessoas e apenas 2,3% dos veículos trafegam com quatro passageiros ou mais, incluindo o condutor. A pesquisa foi realizada entre agosto do ano passado e maio deste ano. O titular da Secretaria Municipal de Urbanismo e Transporte (Semut), José Carlos Aleluia, disse que o estudo deve ser usado para ajudar no planejamento do trânsito na cidade. “Está nos nossos objetivos incentivar todas as pessoas a levar o colega, cada dia um vai de carro. É mais econômico e mais interessante”, disse. Desde quarta-feira, a prefeitura lançou o conceito de faixa solidária na orla, entre a Boca do Rio e Piatã. Uma pista no sentido Itapuã tem sentido invertido entre 6h e 8h, mas só motoristas com carona podem usá-la. Para o superintendente de Transporte da Seinfra, Ivan Braga, os dados apontam uma necessidade de se estimular a carona solidária. “Em outras cidades, você pode usar a faixa exclusiva do transporte coletivo desde que você tenha mais de duas pessoas no carro. Acho que isso é necessário”.
|
---|
Para a analista de transporte e tráfego Cristina Aragón, o estímulo à carona solidária é importante, mas ela apostaria na prioridade ao transporte coletivo. “Esse esforço não deixa de ser válido, porque você começa a levantar a questão, discutir. Mas, em Salvador, eu acho que seria mais produtivo se todo esse esforço fosse canalizado para a priorização do transporte público”, afirmou, destacando que é preciso também investir na melhoria do transporte público na cidade. Ela aponta ainda que a facilidade de se adquirir um carro nos últimos anos também contribui para a superlotação das vias. “Aqui no Brasil ainda se acha que ônibus é coisa de pobre. Por outro lado, a nossa economia é baseada na indústria automotiva, os financiamentos também facilitam bastante”, apontou. A pesquisa mostra ainda que 63,4% das viagens diárias em Salvador e RMS são motorizadas, ou seja, de carro, ônibus, van, motocicleta (veja tabela), e 35,3% a pé ou de bicicleta. Dos motorizados, segundo a pesquisa, 64,9% da viagens são realizadas de forma coletiva e 35,1% de forma individual. De acordo com dados do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), Salvador tem uma frota de 523 mil automóveis (a 9ª do país), 51 mil caminhonetes e 100 mil motos.
SozinhosA assistente social Jucileide Castro, 51, faz parte do grupo de motoristas que andam sós. “Antes, eu tinha um grupo que ia sempre de carona comigo. Mas essas pessoas saíram do trabalho e agora eu costumo andar sozinha”, confessou. Apesar de morar próximo ao CAB, a assistente social vai todos os dias até Lauro de Freitas por conta do trabalho. Mesmo andando sozinha, ela não deixa de reclamar do trânsito e acha que o número de veículos tem que diminuir. “Precisa fazer alguma coisa para melhorar, não só transporte de massa ou aumentar número de vias”, declarou. Apesar de ser o único da casa onde mora com carro, o oficial de náutica Jean Carlos Ferreira, 32, também não costuma compartilhar o espaço do veículo. Jean diz que normalmente anda sozinho por não ter quem se encaixe no roteiro. “Na verdade, não tem ninguém para levar que vá para o mesmo lugar que eu”, disse ele. Já a professora Márcia Duarte, que trabalha e mora em Mussurunga, diz que é adepta das caronas. Mas, ontem, estava sozinha. “Normalmente eu levo colegas. Acho que é o ideal para reduzir bastante os engarrafamentos, porque o trânsito hoje está um caos”, contou. O veterinário Luciano Libório, 43, também foi flagrado na Boca do Rio sem mais ninguém no carro, mas disse que a cena é incomum. “Aqui é lotação completa, hoje é porque fui para o médico”, se defendeu.
SolidárioHá, porém, quem se organize para transportar várias pessoas para o mesmo destino. Mesmo sem um programa consolidado de estímulo às caronas solidárias em Salvador, a cabeleireira Jô Conceição, 45, não trafega sozinha. Na manhã de ontem, ela, que mora em Itapuã e trabalha no Itaigara, parou o carro em frente a um shopping na Boca do Rio para aguardar um colega de trabalho a quem daria carona. No banco ao lado, já levava a depiladora Telma de Jesus, 59, que também mora em Itapuã. “A carona solidária é todo dia, eu já peguei buzu e sei o quanto é horrível”, disse. Jô contou que, mesmo assim, às vezes deixa o carro em casa para evitar os congestionamentos. “É muito engarrafamento e também tem muito carro na rua”, disse. A amiga Telma agradece e compara o tempo de viagem. “Da Sereia (Itapuã) para cá, foram 15 minutos. De ônibus, era pelo menos meia hora, 40 minutos, a depender do horário”, disse Telma, que trabalha no Itaigara. O administrador de empresas e estudante de Psicologia Luciano Menezes, 50, faz parte do segundo grupo – que dá carona a uma pessoa. Todos os dias ele leva a filha, a estudante de Letras Maira Menezes, 22, ao campus da Universidade Federal da Bahia (Ufba) em Ondina. Luciano se assustou com os números da pesquisa. “Isso tudo, quase 70%? Eu não sou tão solitário assim, não. Normalmente, ando acompanhado”, disse. Morador de São Rafael, ele não é o único na família a ter um automóvel. Uma das filhas também tem carro, mas não costuma fazer o mesmo trajeto que a irmã. “De ônibus, já cheguei a levar duas horas para chegar, porque ainda tem o tempo de esperar no ponto, depois o ônibus roda a cidade toda, em engarrafamento, buraco”, disse Maira. Matéria original do Correio
Sete em cada dez carros andam com só um ocupante em Salvador