Recentemente foram divulgados dados surpreendentes acerca do percentual de candidatos postulantes a um credenciamento na OAB e que falham ao não conseguir aprovação no exame de admissão na Ordem, mais especificamente, de 89,7%. Estes dados gritantes, ao contrário do que seria racionalmente esperado, surpreendem justamente pelo baixo nível de comoção entre a massa de excluídos da Ordem, granjeados com um diploma, e aos quais é vedado o exercício da profissão, tal que qual como deveria ser o seu direito! Apenas este dado escandaloso, por si só, deveria levantar um questionamento mais visceral acerca de todo sistema educacional, judiciário, constitucional e legal. Afinal, o que é a OAB? É uma Universidade? É uma instituição de ensino? Estaria acima do MEC? O que dizer daqueles estudantes que concluem o ensino superior, obtêm os seus diplomas e são barrados na porta de entrada? Estamos diante de um grande escândalo, ou melhor dizendo, de uma mastodôntica fraude educacional. Ora, se quase 90% dos formados não consegue passar no Exame da Ordem, existe uma situação, no mínimo, de caráter falimentar, das instituições. A conclusão que se pode tirar é que o nosso sistema jurídico, educacional e legal está falido por qualquer ângulo e ótica que se analise.
O sistema educacional está falido porque não consegue preparar, adequadamente, a grande maioria dos estudantes. O sistema legal está falido porque ele se tornou tão complexo e recheado de “pegadinhas”, remendos e atalhos que se tornou incompreensível e indecifrável para a maior parte dos profissionais de direito e absurdamente obscuro para a população. Um sistema legal, ou seja, um sistema de leis que rege a vida do cidadão comum, desde o menos letrado ao Presidente do Supremo, que quase ninguém entende e impõe uma barreira de entrada, um funil extremamente apertado, não pode ser considerado um sistema legal racional. Afinal, pelo que vemos por aí, melhor seria pegar este sistema legal que nos foi legado e jogá-lo no lixo. O sistema legal brasileiro é um sistema altamente elitista, caro, obscuro e imperscrutável. É evidente que não pode haver justiça para a população quando somos regidos por um sistema de leis obscuro, que apenas 10% dos formandos consegue, minimamente, decifrar. Alguns efeitos claros e evidentes deste processo salta aos olhos de quem não pertence ao meio jurídico, que é uma evidente redução na oferta de advogados credenciados para a população, contribuindo para diminuir a concorrência e o garantimento perverso de uma justiça cara e inacessível. Estamos analisando aqui apenas um aspecto de total e completa distorção de apenas uma carreira. Afinal, a quem interessa um funil desta ordem? Por outro lado, é interessante perguntar: se apenas 10% dos bachareis em direito estão aptos a exercer a profissão de advogado, qual tem sido, então, o destino dos outros 90%? Não haveria um excesso de cursos de direito no País? Não estariam as pessoas, tragicamente, escolhendo as profissões erradas? Por fim, não deveria o exame da OAB ser apenas um qualificador na hora da escolha de um profissional? "Se eu posso pagar, pago um advogado da OAB”. Mas seu eu não posso pagar, porque não posso contratar o “genérico”? A opção para aquele que não pode pagar é simples assim. Fica sem advogado e sem defesa. Por outro lado, é de se perguntar se não estaria havendo um número excessivo de estudantes postulando uma carreira de advogado. Afinal, fica bem claro que, se o percentual se invertesse, ou seja, 90% dos postulantes fossem aprovados, haveria provavelmente uma superpopulação de advogados neste país. Por qualquer ângulo que se enxergue, a situação é sempre absurda. Aqui levantamos uma outra pergunta, relacionada com outra carreira disputada. Porque tantos alunos almejam aprovação em um curso de medicina, quase como um Graal? Uma rápida conversa com os adolescentes postulantes parece revelar uma determinada crença de que medicina é garantia de recompensa, de sucesso financeiro. Nada a ver com o sacerdócio legítimo, mas sim uma certa motivação econômica parece encobrir os reais motivos pelos quais muitos dos melhores alunos concorrem por uma vaga em medicina. Esta “vocação”, aliás, parece determinar o vazio de médicos que encontramos nos grotões deste país. Ninguém quer sacrificar sua “carreira” para atender os menos afortunados nos rincões do país em nome de um “sacerdócio naive”.
De toda forma, muitas vozes já se levantam contra a propagação dos cursos de medicina no país, provavelmente antevendo que em um par de décadas iremos experimentar uma saturação neste mercado de trabalho e uma progressiva deterioração nas remunerações. Por ora, nada parece indicar uma saturação, embora em algumas capitais já se observe um problema derivado da concentração e má distribuição geográfica. Sim, formamos médicos, muitos médicos, mas não se investe praticamente nada em infraestrutura hospitalar. O médico se forma e tem dificuldade em fazer uma residência. Será que estamos condenados a uma escassez de hospitais e uma profusão de clínicas? Do outro lado da balança o grande déficit de profissionais na área de tecnologia vai ficando cada vez mais patente. Parece haver algum tipo de alergia, aversão ou rejeição entre os alunos brasileiros no que diz respeito à área de exatas. No final das contas, acabamos por formar um exército de bacharéis em direito, que não irão conseguir passar no exame da Ordem e faltam profissionais na área de exatas. Este desequilíbrio atinge diversas áreas de tecnologia, e o país corre o risco de sofrer com a saturação e excesso de profissionais na área de humanas, enquanto experimenta uma escassez contundente na área de exatas.Porque direcionamos tão poucos profissionais para a área de exatas no Brasil ao passo que continumaos encaminhando tantos profissionais para áreas que aparentam saturação ? Parece que o Brasil foge do ensino de matemática. Cursar física é como ser pregado na cruz. O ensino de física, tão criticado, nada mais é do que o raciocínio matemático aplicado ao mundo real. Um rápido olhar sobre a forma como é ensinada a disciplina de Física no Brasil é capaz de nos fazer chorar. Isto pode ser sintetizado pelo refrão de um antigo sucesso dos Paralalamas do Sucesso: “Eu odeio física”... Este sentimento sintetiza a aversão à Ciência no Brasil. Ensinamos mal física, ensinamos mal lógica e ensinamos pessimamente matemática. Pior do que isto é a orientação para ensinar matemática agregada à interpretação de texto. Ensina-se a resolver probleminhas baseados em pegadinhas, mas se ensina pouco a matemática objetiva. Colocamos computadores nas escolas, mas não existem professores de lógica, matemática e de programação. Ensina-se a usar o computador, ao nível de usuário, mas não se ensina linguagem de programação, nem ao menos linguagem de Script PHP e HTML. Os professores não recebem treinamento e capacitação adequadas. O Governo imagina que revolucionar a educação é dar um tablet para cada aluno na escola pública e misturar disciplinas, estimulando a interdisciplinaridade, o que somente aumenta a confusão do aluno. Certamente tal ação irá render votos, mas não contribuirá em nada para melhorar nosso claudicante panorama em ciências. Dito isto, por medo da área de exatas, continuaremos formando bacharéis que nunca irão advogar, e ainda assim rumamos céleres rumo ao topo que nos tornará campeões mundiais da litigância, onde todos processam a todos, tudo fica paralisado e ninguém produz mais nada. Sugestão que fica, vamos formar mais engenheiros e menos advogados. O Brasil precisa de mais gente produzindo para vencer na vida, e não gente que vence na vida processando alguém ou alguma empresa. É evidente que isto não vai dar certo. Leia as colunas anteriores: Quer fazer intercâmbio? Prepare-se para os editais do Ciência sem Fronteiras Quer ser pesquisador? está aberta a temporada de editais para Iniciação Científica
Se não existisse o exame da OAB, haveria, provavelmente, uma superpopulação de advogados |
"Será que estamos condenados a uma escassez de hospitais e uma profusão de clínicas?" |
Sergio Sampaio E-mail: [email protected] Consultor de TI da ValoRH. Engenheiro, empresário da área de Tecnologia da Informação, proprietário da IP10 Tecnologia. |
---|
Veja também:
Leia também:
AUTOR
AUTOR
Participe do canal
no Whatsapp e receba notícias em primeira mão!
Acesse a comunidade