O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, concedeu nesta quinta-feira liminar à Netflix autorizando a volta da exibição do especial de Natal produzido pelo Porta dos Fundos, que retrata satiricamente Jesus Cristo como homossexual. Ele suspendeu a decisão do desembargador Benedicto Abicair, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que mandou tirar o programa do ar. Toffoli ponderou que sua decisão não desrespeita a fé cristã. Segundo o ministro, os valores do Cristianismo são fortes o suficiente para não serem abalados por uma sátira.
“Não se descuida da relevância do respeito à fé cristã (assim como de todas as demais crenças religiosas ou a ausência dela). Não é de se supor, contudo, que uma sátira humorística tenha o condão de abalar valores da fé cristã, cuja existência retrocede a mais de 2 (dois) mil anos, estando insculpida na crença da maioria dos cidadãos brasileiros”, escreveu Toffoli.
O ministro também lembrou que, em sua história recente, o plenário do STF tem reforçado “a plenitude do exercício da liberdade de expressão como decorrência imanente da dignidade da pessoa humana e como meio de reafirmação/potencialização de outras liberdades constitucionais”.
No recurso apresentado ao STF, a empresa chamou a decisão de “censura judicial” e considerou a revogação necessária para resguardar a liberdade de expressão. Toffoli deu a decisão porque, como presidente da Corte, ele está responsável pelas decisões urgentes durante o recesso. Em fevereiro, quando o tribunal retomar as atividades, o caso será enviado para o gabinete do ministro Gilmar Mendes, sorteado relator do processo. Ele poderá manter a decisão de Toffoli ou revogá-la.
Segundo a Netflix, o desembargador desrespeitou decisões tomadas pelo próprio STF que preservaram o direito à liberdade de expressão. “Não há dúvidas de que a recalcitrância da prática da ‘censura judicial’ representa hoje uma das maiores ameaças às liberdades comunicativas no cenário nacional”, diz trecho do pedido da Netflix, destacando que a liberdade de expressão é “alicerce fundamental do Estado Democrático de Direito”.
A decisão do desembargador foi tomada no início da tarde de quarta-feira. Vinte e quatro horas depois, o especial de Natal continuava no catálogo da Netflix. A plataforma ainda não foi notificada oficialmente da decisão e, por isso, manteve a produção no ar.
Divulgado no ano passado, o especial de Natal do Porta dos Fundos gerou críticas de grupos religiosos. No programa, Jesus, que é interpretado pelo ator Gregório Duvivier, namora Orlando, vivido por Fabio Porchat. Após a repercussão do programa, a sede da produtora, no Rio, foi atacada com coquetéis molotov.
Ao decidir pela suspensão do filme, o desembargador afirmou que, nessa fase do processo, ainda não há como decidir se houve incitação ao ódio público por parte da produtora e “com quem está a razão”, mas para “acalmar os ânimos” da sociedade entende ser “mais adequado e benéfico” suspender a exibição. O magistrado determinou ainda a suspensão de trailers, making of, propagandas, “ou qualquer alusão publicitária ao filme” na Netflix e em qualquer outro meio de divulgação. O pedido foi feito pela Associação Centro Dom Bosco de Fé e Cultura.