Ao entrar em um táxi, a jornalista Amanda Duarte, de 26 anos, foi questionada sobre em quem votaria no primeiro turno da eleição para presidente do Brasil. Respondeu, mas não teve a opinião bem aceita. Enquanto o motorista julgava sua escolha e tentava convencê-la a mudar, preferiu ficar calada (“Falei bem pouco, para não criar intriga no carro, pois ele tinha que me deixar bem em casa”). Não foi o caso, mas apesar do silêncio da passageira, o condutor poderia com isso ter recebido uma avaliação negativa no aplicativo de transportes pelo qual foi acionado.
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— Eu não avalio mal ninguém. Se eu não gosto, simplesmente não avalio — conta a jovem Amanda.
Com a proximidade da eleição, tão polarizada neste ano, a vontade de se posicionar é grande muitas vezes. Mas a recomendação dos especialistas aos autônomos e donos de empresa em geral é que evitem se associar a algum candidato. Ou saibam os riscos que o negócio está correndo ao fazer isto.
— Os ensinamentos de marketing apontam para que as empresas conheçam muito bem seus clientes, como eles pensam e o que preferem, de modo a entenderem as necessidades deles e proverem produtos e serviços. Isso serve também para definirem quais posturas e posicionamentos adotarem. No entanto, é raríssimo na nossa sociedade identificar claramente quais são as preferências de clientes no viés político. E ainda assim, seria necessário enviar a propaganda só para aqueles clientes que se identificam com ela. Como então há muitos riscos, a melhor coisa é não se envolver nisso e manter a empresa neutra — afirma o professor Claudio Corrêa, da Escola de Negócios da Celso Lisboa.
Na semana passada, a estudante Bárbara Mendonça, de 18 anos, foi adicionada pela ginecologista em um grupo de Whatsapp com desconhecidos voltado para a divulgação da candidatura do marido da médica.
— Confesso que não cheguei a abrir o vídeo. Só vi a galera comentando sobre o que era e saí (do grupo) — lembra ela.
A ginecologista de Bárbara pode até ter imaginado não haver problema em falar, de cidadã para cidadã, sobre uma candidatura em que confia. Mas o professor Claudio Corrêa explica que esta é uma confusão comum na cabeça de empreendedores e esclarece:
— Se a origem do contato com aquela pessoa foi a empresa, o empreendedor não pode falar com seu cliente como pessoa física. É difícil desassociar.
Grandes empresas exploram valores
Talvez o empreendedor, ao escolher se posicionar, guarde na lembrança algumas medidas adotadas por empresas grandes, que têm escolhido o engamento político como ferramenta de publicidade. Nos exemplos, no entanto, as marcas não se associam a candidatos, e sim a causas.
— Nos dias de hoje, algumas marcas já estabelecidas buscam se posicionar a respeito de temas polêmicos e não se furtam a abrir diálogo com seus consumidores. Há exemplos recentes como a Natura e suas campanhas de dia dos pais e dia dos namorados no Brasil (com a participação de casais gays) ou, mais recentemente, a Nike, nos Estados Unidos, contratando o Colin Kaepernick, ex-atleta de futebol americano que liderou o protesto contra abusos policias contra a população negra. Em ambos os casos, estas marcas se associaram a propósitos que elas acreditam serem ligados a sua missão: o motivo pelo qual existem. E, claro, alavancaram as suas vendas com isto — afirma o especialista em empreendedorismo, diretor de Educação Continuada da Estácio, Eduardo Senise.
O professor Cláudio, da Celso Lisboa, porém, alerta para os riscos envolvidos ainda assim.
— Uma coisa possível é falar de seus valores sem associar a um candidato, mas mesmo assim será difícil, pois se um candidato reforça muito em seu discurso determinada bandeira e o empreendedor citá-la, o público pode fazer a associação. Ou, em época de proliferação de fake news (notícias falsas que são fabricadas e compartilhadas na rede), uma campanha de marketing neutra pode ser coaptada por um candidato. É uma areia movediça — alerta o professor Cláudio.
Para ajudar os pequenos empreendedores a agirem adequadamente até o dia das eleições, o EXTRA buscou dicas do que fazer ou não.
Dicas para empreendedores no período eleitoral
1 - Não cometa assédio: sua empresa não é obrigada a declarar apoio a nenhum candidato. Mas se você quer fazer isso, não pode de maneira alguma pressionar as pessoas que trabalham com você para tomarem a mesma atitude. Em uma democracia, o voto é secreto e individual.
2 - Caso você apoie um candidato: esteja preparado para perder parte dos seus clientes que julgam a sua decisão equivocada. Ao menos por um tempo, é natural que parte destas pessoas prefira demonstrar seu apoio a outros candidatos e outras marcas mais alinhadas com a sua opinião política.
3 - Caso você não apoie nenhum candidato: é natural que parte dos clientes queiram falar a respeito das eleições e inclusive fazer propaganda dos seus candidatos. Com educação, mostre que de acordo com as regras de conduta da sua empresa, você não considera o assunto adequado.
- Se você não está preparado para as consequências de apoiar um candidato, não coloque no perfil ou no feed das redes sociais ou Whatsapp da empresa qualquer menção a políticos. Foto, número, nome, cores, expressões e peças de comunicação de candidatos não devem ser usados.
- Não envie propagandas favoráveis ou contrários a quaisquer candidatos para seus clientes.
- Não crie nem participe de grupos favoráveis ou contrários a qualquer candidato usando os contatos comerciais.
- Oriente seus funcionários a não expressarem suas opiniões pelos canais da empresa ou entrarem em polêmicas, mesmo que os consumidores iniciem debates em torno da política.
4 - Não seja invasivo: esta dica é importante sempre, e mais importante agora. Há regras para o envio de mensagens para clientes; respeite. Isto é fundamental para construir um relacionamento de confiança e duradouro. Lembre-se que é muito mais barato manter clientes satisfeitos do que buscar novos clientes o tempo todo.
5 - Não alimente os trolls: a internet está cheia de pessoas que querem apenas desestabilizar as discussões e enfurecer os outros. Estes chamados trolls têm grande quantidade de combustível oriunda de fake news e não costumam ter qualquer apreço por um debate moderado e verdadeiro. Dessa maneira, evite debater com estes perfis. Não alimente polêmicas com eles e não se envolva em debates destrutivos, é exatamente o que eles querem.
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Redação iBahia
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