Você já ouviu falar de ‘Do It Yourself’ (‘Faça Você Mesmo’, em tradução livre)? Provavelmente, crianças com acesso a vídeos no YouTube, sim. Inúmeros canais voltado ao público infantil ensinam a montar objetos, fazer brinquedos, entre outros. Isso tudo tem a ver com a cultura maker, que está cada vez mais inserida no universo das escolas. Essa cultura de “fazedor” acredita que qualquer pessoa pode consertar, modificar e até mesmo criar objetos com as próprias mãos.
Por serem características muito presentes nas novas gerações, muitas escolas têm entendido que as antigas metodologias devem abrir espaço para esse novo conceito que coloca o aluno em posição de destaque no ensino. Nesse contexto, empresas como a Mundo Maker e a Nave à Vela, ambas com sede em São Paulo, utilizam o construcionismo para colocar em prática a linha de pedagogia.
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De forma resumida, o construcionismo é uma teoria proposta pelo matemático e educador Seymour Papert, e diz respeito à construção do conhecimento baseada na realização de uma ação concreta desque resulta em um produto palpável.
Lucas Torres, CEO do Nave à Vela, explica que esta teoria passa pelo objetivo de ajudar na formação para o século XXI. Isso significa que a criança é preparada para ter as competências que serão exigidas no futuro. “Hoje temos uma trajetória menos linear, o que significa uma exigência maior. Os próprios empregos estão passando por transformações. Com isso, as crianças precisam aprender a ser pessoas mais flexíveis e fazer seus próprios caminhos”, opina.
O discurso de Lucas é convergente com o que explica Fábio Zsigmond, um dos co-fundadores do Mundo Maker. “Nós temos uma filosofia que dá aos alunos competências que ajudam para a vida. São competências individuais, ou seja, com ele mesmo; ele com a sociedade; e ele com o mundo e o sistema das coisas”. Lá, para o trabalho com os alunos, é utilizado aprendizagem criativa, um dos campos do construcionismo. E ela, explica Zsigmond, é fundamentada em quatro pilares: o trabalho baseado em projetos, a aprendizagem aos pares, o respeito às paixões e a atitude de brincar.
Protagonismo
Quando o aluno passa a ser incorporado na cultura maker, ele começa a ser o protagonista do aprender. E o professor deixa de ser o disciplinador, para ser uma espécie de mediador.
De acordo com Fábio, a responsabilidade nesse universo passa a ser do aluno. “Nesse espaço a criança sabe que a disciplina que ele tem influencia diretamente no que ele está criando. Como acontece na vida. O aluno aprende que se ele tem segurança e respeito com ele mesmo, com o outro e com as coisas, ele pode fazer qualquer coisa, pois vai navegar pelo espaço de maneira harmônica. Ele mesmo faz uma auto-avaliação se o procedimento é possível e seguro”.
E, durante esse processo, errar e acertar faz parte, já que dessa forma o aluno passa a entender todo o processo – e o esforço – para conseguir chegar ao produto final. “A observação, a paciência, a perseverança e a troca de experiências com seus parceiros são requisitadas, constituindo-se uma aprendizagem para a própria vida”, destaca Joseli Lordelo, supervisora pedagógica da escola Girassol, em Salvador.
Voltada para crianças e pré-adolescentes, até o 5º ano do ensino fundamental, a escola soteropolitana adotou a Robótica e, com isso a cultura maker, em 2009. “Os conceitos da Cultura Maker surgem nos projetos em que agregamos o uso de elementos próprios da Robótica (motores, sensores e dispositivos programáveis) a todo tipo de material comum na Escola. Neles, os alunos empreendem na produção de soluções, materializando as próprias criações, como robôs humanoides e brinquedos de parques de diversões”, explica Michele Rodrigues, coordenadora de Robótica da escola.
O resultado
Nem tudo na vida tem resultado imediato, e a influência da cultura maker na educação passa também por uma observação a longo prazo. No entanto, alguns aspectos na melhora do interesse do aluno são visíveis rapidamente. De acordo com Torres, o aumento do engajamento dos alunos é algo perceptível. “Ele [aluno] passa a semana sentado em uma sala de aula ouvindo, quando é colocado em outro ambiente, onde ele se torna o “fazedor”, a reação é pedir por mais momentos como este”.
“Acontece de acabarem as aulas e o aluno permanecer no espaço maker para continuar seu projeto”, conta Zsigmond.
Como ser maker na educação
Além da aplicação do conceito, algumas ações práticas reforçam a cultura maker nas escolas. Uma delas é criação de um espaço maker. Este pode ser um laboratório já existente na escola ou até mesmo uma sala, mas que seja voltada apenas para este fim. Na Girassol, por exemplo, os laboratórios de Ciência e Robótica são suportes para este tipo de aprendizado. A supervisora pedagógica explica que o uso de materiais alternativos se transforma em elementos que garantem o “aprender fazendo” desde os períodos iniciais.
Além do espaço, é importante também que os professores estejam inseridos na cultura maker. E isso pode incluir docentes de todas as disciplinas. Para as profissionais da escola Girassol, o engajamento dos professores é fundamental para a implementação da cultura maker. “O professor, ao planejar e conduzir as intervenções, cria um ambiente desafiador e investigativo, valorizado e dando razão ao potencial criativo dos alunos”.
E ter o suporte da escola – seja na pedagogia ou na organização do espaço – faz com que os professores se desafiem e busquem novas formas de aprendizado. “Nós enxergamos um início de mudança de cultura dos próprios professores. Hoje temos professores que querem inovar, mas às vezes não encontram espaço nas escolas. Com as ferramentas, eles começam a trabalhar de forma diferente”, opina Lucas.
Na prática
A ideia de cultura maker na educação é colocada na prática em ações do NAVE, o Núcleo Avançado em Educação, criado pelo Oi Futuro. O programa, em parceria com as Secretarias de Estado de Educação do Rio de Janeiro e de Pernambuco, desenvolve atividades inovadoras que envolvem a cultura maker. A ideia é trabalhar com o “colocar a mão na massa” e formar jovens para as economias digital e criativa, com foco na produção de games, aplicativos e produtos audiovisuais.
“O NAVE é um laboratório de experimentação, sempre em renovação, onde professores e estudantes encontram ambiente e infraestrutura preparados para incentivar a inovação e recebem apoio de conteúdo técnico para desenvolvimento criativo e tecnológico”, diz Suzana Santos, presidente do Oi Futuro.
No NAVE, estudantes combinam computadores e materiais como papelão, cola e tesouras para criar máscaras para a reflexão sobre a condição humana, por exemplo. Essa e outras dezenas de práticas estão disponíveis no e-book “E-NAVE”, lançado em maio deste ano. Dividido em oito capítulos temáticos, o livro digital descreve práticas do mundo tecnológico; retorno ao analógico, mostrando que os conceitos sobre programação podem ser úteis mesmo sem o uso de computadores, smartphones ou tablets; e práticas que desenvolvem competências como empatia, cooperação e autonomia e que mostram que o professor não é o único detentor do saber.
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Redação iBahia
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