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SALVADOR

Bloco 'De Hoje a Oito' irá homenagear os índios neste Carnaval

Amigos, intelectuais e moradores do Santo Antônio, se uniram para recriar novos formatos, mais democráticos, de carnaval em Salvador

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06/02/2015 às 11:21 • Atualizada em 29/08/2022 às 21:05 - há XX semanas
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As mãos de Ênio batiam frenéticas, em compasso rítmico festivo. Ora mais rudes, ora mais brandas, as suas mãos faziam gestos positivos quando algo parecia lhe agradar. O suor descia pelo seu rosto e molhava o apito, de onde saiam ordens específicas para cada ala da bateria do Bloco de Hoje a Oito. Era quinta feira a noite e a praça principal do bairro Santo Antônio abarcava naquele momento uma série de pessoas, todas com instrumentos na mão, para mais um ensaio do que virá a ser conhecido (nesse final de semana) pela população local como Carnaval de Índio. O Bloco De Hoje a Oito é um coletivo autônomo composto por amigos, intelectuais e moradores do Santo Antônio, que se uniram com o intuito de recriar novos formatos, mais democráticos, de carnaval. Utilizando-se de fantasias e interagindo com o público de maneira direta, já que eles desfilam sem corda, o De Hoje a Oito se apodera de diversas características da cultura popular para embasar a sua formação enquanto bloco. Laura Castro, integrante e uma das fundadoras do grupo, acredita que a cultura está sempre viva e tem que ser posta em reinvenção a todo instante. De acordo com ela o bloco “se inspira na cultura popular baiana e põe em evidência elementos não mais conhecidos como as escolas de samba de Salvador, os blocos de índio que esse ano iremos homenagear, o samba de roda do recôncavo, uma porção de coisas que não passam pelo axé music e os trios elétricos. A gente se inspira, mas não com o sentimento saudosista, de querer reviver tudo isso, na verdade o que a gente quer é a mistura, a mixagem, as novas possibilidades dentro da tradição”. O surgimento Em 2011, quando o carnaval baiano era outro e as iniciativas populares também, um contingente de pessoas, amigos em sua maioria, possuíam o desejo em comum de aprender a tocar instrumentos percussivos. Decidiram então por fazer aulas com um músico, chegado a pouco de Campinas – SP, que sacava de ritmos e, principalmente, de samba. Ênio Bernardes, hoje mestre de bateria do De Hoje a Oito, trocou experiências com todas aquelas pessoas e, juntos, decidiram por criar um bloco de samba onde pudessem se apresentar e desfilar pelas ruas do bairro Santo Antônio. Foi só após muitas reuniões que o bloco pode, enfim, nascer e mostrar-se à cidade de Salvador. O De Hoje a Oito tem a sua primeira apresentação datada no dia dois de novembro de 2011. De lá para cá, o bloco foi se modificando em alguns aspectos, como, por exemplo, o número de participantes e os recursos financeiros. Marta Luna, integrante do bloco, explica que se no início os músicos que compõem a bateria giravam em torno de 40, hoje, não passam de trinta pessoas. “É natural dentro do processo de construção de qualquer dispositivo cultural que algumas pessoas se desliguem e outras apareçam. O De Hoje a Oito foi renovando parte do seu núcleo ao longo desses quatro anos, o que contribuiu para novas ideias e formatos entre nós mesmos”. Já na questão financeira, o bloco não possui fins lucrativos. Não é do interesse dos componentes comercializa-lo. Ao longo do ano, o De Hoje a Oito realiza algumas festas para arrecadar fundos para a saída do bloco, antes do carnaval. No entanto, a proposta do grupo não gira em torno do lucro comercial. Carnaval de índio Trabalhando com a questão temática dentro de suas apresentações, esse ano, o De Hoje a Oito irá homenagear os índios no seu samba enredo. O critério de escolha se deu através de uma longa pesquisa acerca de assuntos variados, o que desaguou na relação do índio com o carnaval. Segundo Tiago Ribeiro, integrante do bloco, a questão indígena carnavalesca, ao contrário do que muitos pensam, não possui influencia brasileira, mas sim, estadunidense. “Através da nossa pesquisa, a gente pode constatar que o surgimento dos blocos de índio aqui na Bahia, se deram muito pela influência do cinema americano da época, que exportava diversos filmes de ‘bang bang’ pra cá. Nesses filmes, a figura do índio sempre aparecia, o que ocasionou na criação de alguns blocos em Salvador. Apaches, Comanche e por aí vai, são nomes americanos, e não brasileiros. Em determinado momento eles assumem características e referências nacionais, mas de início, não foi assim que aconteceu”. Tiago ainda explica que grande parte desses blocos se diluíram, ou foram mudando o seu formato ao longo do tempo, que perderam o caráter popular. E foi justamente aí, analisando todas essas questões que o De Hoje a Oito pensou a sua inserção dentro do tema e as maneiras de trazer isso novamente para a população. O compromisso Além da parceria já firmada com a alegria e a diversão, o bloco De Hoje a Oito também assume outras funções sociais. Laura afirma que há, primeiramente, o cuidado e a preservação para com o Santo Antônio, onde o bloco desfila. “A gente faz algumas campanhas que vão desde o ‘não jogar latinhas e outras coisas as ruas’ até o ‘peça para usar o banheiro de algum morador ao invés de sujar o bairro’”. Os organizadores também alertam para quem vem de fora não trazer carro, porque pode causar um engarrafamento e abalar as estruturas das ruas do bairro. Marta, por sua vez, aponta a interação familiar como um dos objetivos do bloco. Ela diz que no primeiro ano, o De Hoje a Oito reuniu o público jovem, em geral, mas que isso foi mudando. Em 2014 o bloco desfilou com mais de três mil pessoas seguindo-os, e dentre elas, crianças, pais, avós, jovens, enfim, as mais diversas faixas etárias que souberam interagir e fazer um dia de comemoração e respeito. Tiago, por fim, revela que a função social do bloco é também trazer a possibilidade de novas reinvenções dentro do carnaval baiano. “Acho que o que a gente possui de identidade é justamente a nossa diferença. É interessante que o carnaval não fique centralizado apenas na avenida e no circuito Barra/Ondina, que ele possa ter eixos nos mais distintos bairros da cidade. Acredito que seja essa a forma de devolver os festejos carnavalescos para o povo baiano”. *Mariana Kaoos é repórter e colaboradora do iBahia no Carnaval 2015

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