A cada dia, as redes sociais são tomadas por uma nova discussão. O debate que invadiu o Facebook na manhã de segunda-feira foi o chamado “senta x levanta” da Concha Acústica, que no último domingo recebeu o show Paulinho da Viola Encontra Marisa Monte, um tributo ao samba e ao próprio compositor carioca, autor de clássicos como Pecado Capital.
Paulinho, que abriu a apresentação, ficou visivelmente desconcertado quando parte do público, incomodada com os espectadores que insistiam em permanecer em pé, soltou gritos de “senta! senta!”, que atrapalharam a apresentação. Depois de algum tempo em silêncio, o músico retomou o show, mas a confusão recomeçou. Dono de uma voz suave, Paulinho mal era ouvido pela plateia por causa da discussão.
Transtornos
E os problemas não pararam por aí: o bate-papo intenso na plateia atrapalhou os que realmente queriam curtir o show - talvez mais apropriado para um espaço mais intimista- muitos se levantavam constantemente para comprar cerveja e o barulho no bar não permitia ouvir momentos intimistas do show, em que Paulinho e Marisa conversavam sobre a história do samba e da Portela e por aí vai.
Isso sem falar nos celulares: não bastasse a luz emitida pela tela do aparelho para atrapalhar o público durante as filmagens e fotos, ainda havia o flash insistente na hora de tirar aquele selfie para pôr as redes sociais em dia.
E não foi a primeira vez que isso aconteceu, como lembra o assessor de imprensa Júlio Gomes, antigo frequentador da Concha Acústica: “No show de Teresa Cristina e Caetano Veloso (em janeiro deste ano), houve o mesmo problema. Teresa Cristina precisou pedir, com o microfone, para que uma moça sentasse. Mas não adiantou e o público começou a gritar”, lembra-se.
Júlio defende que a Concha deve continuar sendo um espaço democrático, como sempre foi: “Acho uma bobagem isso: se quiserem ver sentado, que seja sentado; se quiserem em pé, que seja em pé”.
Polarização
A administração da Concha já emitiu até um comunicado nas redes sociais, em que reforça o caráter democrático do espaço: “Na Concha Acústica, o público se comporta de forma espontânea. É o tipo de ambiente em que todos e todas podem decidir o melhor momento de ficar quietinho em silêncio, ou dançar e cantar junto. Este movimento acontece de forma natural: aqui, o clima é de deixar fluir”.
“Esta discussão tão intensa reflete a época polarizada em que vivemos. Mas as pessoas esquecem que há o caminho do meio, que é bem mais suave”, opina Moacyr Gramacho, diretor do Teatro Castro Alves, que administra a Concha.
Para Moacyr, não é a direção do espaço que deve determinar como o público tem que se comportar: “Este é um lugar de comunhão e não é nosso desejo decidir pelo público. Não nos cabe conduzir o comportamento das pessoas”.
Mas Moacyr anuncia uma mudança que deve ocorrer logo: o fosso não poderá mais ser ocupado pelo público, assim como a área de circulação, em frente ao palco. A decisão ocorre por questões de segurança, segundo o diretor. “Vamos ser mais rígidos no cumprimento dessas medidas. Os seguranças vão avisar a cada pessoa que esteja ali que desocupe a área”, garante Moacyr. Mas haverá alguma flexibilidade, como na hora do bis, em que tradicionalmente o artista convida o público a se aproximar do palco para dançar.
Barulho
A cantora Márcia Castro já se apresentou na Concha e também já esteve ali muitas vezes como espectadora. “O comportamento do público deve variar de acordo com o show, porque aquele espaço permite isso. A normatização é perigosa porque pode limitar a liberdade das pessoas. Já fui a show de Gilberto Gil para ficar em pé e no de Teresa Cristina fiquei sentada”, diz.
Mas Márcia Castro vê outros problemas, ainda mais graves que o “senta x levanta”: “O barulho que sai da área do bar me incomoda muito. Uma vez, reclamaram com uma senhora sobre o barulho e ela disse algo como ‘se quer silêncio, vá para o teatro’. Sei que o bar é uma área de socialização, onde as pessoas querem conversar. Mas o silêncio tem que ocorrer em qualquer lugar da Concha”, enfatiza a cantora.
O professor universitário Sérgio Sobreira também irritou-se com o burburinho: “O público da Concha consagrou um comportamento baiano cuja raiz está na festa de largo e nas micaretas. É a ideia de que as pessoas estão ali somente para se divertir, não importando quem esteja no palco”.
Sérgio acrescenta que hoje se vive naquilo que ele chama de um “tsunami” de entretenimento: “As pessoas pensam que estão no mundo somente para se divertir e não entram em contato com outro de tipo de experiência. E mais: as redes sociais tiraram as pessoas da posição de passividade e elas querem ser protagonistas sempre. Não entendem que num espetáculo como aquele, o protagonista é o artista”, critica.
Irá Carvalho, sócia da Iris Produções, que já levou muitos artistas ao palco da Concha, diz que a Associação de Produtores vai se reunir com a direção do TCA em breve para dar sugestões sobre como solucionar alguns desses problemas mais comuns na Concha.
Irá esteve como espectadora no show de Paulinho e Marisa e também passou por transtornos: “Tinha uma turma do meu lado que levantava o tempo inteiro para ir ao bar durante o show. Tinha outro grupo que parecia que estava num boteco, conversando o tempo todo. O pessoal devia ter se informado melhor, sabendo que era um show intimista. Talvez não fosse show para a Concha. Acabou sendo desconfortável para os artistas e para o público”, pondera.
Veja também:
Leia também:
AUTOR
Redação iBahia
AUTOR
Redação iBahia
Participe do canal
no Whatsapp e receba notícias em primeira mão!
Acesse a comunidade