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Uma arma na cabeça e a única certeza do mototaxista Anderson* era de que não poderia mais ver a mulher e a filha recém-nascida. “É como se a morte tivesse pedido carona”, conta. Em março deste ano, uma loira, de vestido estampado, montou em sua moto. Eram por volta das 19h no Lobato. Ele a levou até a Rua São Luís – local de pouca iluminação. Quando esperava os R$ 2 pela corrida, teve como pagamento um revólver calibre 38 direcionado para sua cabeça. Era o comparsa da mulher, que surgiu em meio à escuridão e o retirou do veículo a tapas. O casal fugiu na moto e o caso foi mais um para a estatística da Secretaria da Segurança Pública (SSP). Levantamento feito pelo o CORREIO com base em dados divulgados diariamente pela SSP mostra que em cada três veículos roubados em Salvador, um é moto – foram 2.163 carros e 947 motos levados pelos ladrões só este ano. No entanto, como a frota de motos é quase seis vezes menor do que a de carros (96.291 contra 555.775, segundo o Detran), o cálculo mostra que, proporcionalmente, rouba-se 2,5 vezes mais motos do que carros na capital - 9,83 de cada mil motos foram roubadas este ano, contra um índice de 3,89 dos carros. Entre os 20 bairros onde há mais roubos de motos, três chamam a atenção pela desproporção entre o número de motocicletas e carros roubados: na Baixa do Fiscal, 92% dos veículos roubados são motos, no Largo do Tanque essa proporção é de 84% e no Lobato – onde Anderson foi assaltado - 77%. Para delegado Nilton Borba, da Delegacia de Repressão a Furtos e Roubo de Veículos (DRFRV), o roubo de motos tem relação direta com o poder aquisitivo dos bairros. “Você não vê tantas motos na Pituba como no Largo do Tanque e adjacências, por exemplo”, declara. A Pituba, inclusive, que é a quarta colocada no roubo de carros (133 roubos, atrás só de Brotas, Itapuã e Cabula), soma 11 roubos de motos e só vai aparecer na 27ª posição nesse ranking.
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ViolênciaA violência é elemento constante nos roubos de motos. De cada 10 motos levadas por assaltantes, 9 são tomadas na presença do proprietário e uma é furtada. Há mais de cinco anos trabalhando no ponto de mototáxi no Largo do Tanque, Roberto* teve o veículo levado há cerca de dois meses. Era uma Honda vermelha, modelo 2011, - “um sonho de consumo” para ele. Roberto conta que um homem pediu para ser levado à Boa Vista de São Caetano, mas no meio da Ladeira de São Caetano o passageiro pediu para parar. “Achei que ele passava mal. Então encostei a moto”. Em seguida, o homem mostrou-lhe a arma. Para continuar a trabalhar, Roberto comprou outra moto, mas desta vez mais simples. “A gente não pode botar moto nova para rodar porque até os próprios caras do bairro ficam de olho”, diz o mototaxista. Hoje, Roberto tem mais cautela. “Se alguém pedir uma corrida para a invasão de Nova Constituinte (em Paripe), só levo até o largo do bairro e que o outro mototaxista da área faça o resto”, ensina. Ele conta que certa vez, tinha acabado de deixar uma morena no Lobato, quando um rapaz, com um blusão folgado, pediu para levá-lo para uma rua. “Estranhei porque ele não pediu para outro mototaxista da área que já estava ali há um bom tempo. Então disse pra ele que não trabalhava no ponto dos outros e saí”, conta. O auxiliar de escritório Fernando* mora a cerca de 100m do Complexo Policial da Baixa do Fiscal, numa casa de dois andares e garagem no térreo, onde ficam guardados a moto dele – uma Honda Pop 100 - e o carro da mãe. Há três semanas, ele saía de casa para trabalhar. Quando se preparava para dar a partida da moto, três outros motoqueiros (dois numa moto), se aproximaram a anunciaram o assalto. “Foi algo inevitável! Nem tive reação. Já estavam esperando eu sair. Agora, estou andando de ônibus”, conta. Ele disse que prestou queixa na DRFRV, mas até agora não teve notícias de recuperação. “A esta hora, a moto deve estar sendo usada em crimes ou foi desmontada e montada numa outra”, deduz. O próprio delegado da DRFRV reconhece que a recuperação de motos é muito mais difícil que a de carros, justamente pela facilidade em desmontá-la e revender as peças.
AumentoAs estatísticas da SSP indicam ainda um crescimento de 50% no número de roubos de veículos - carros e motos - com relação ao ano passado. De acordo com boletins mensais da SSP - que em média apresentam números 21% mais altos que os diários -, de janeiro a junho do ano passado foram roubados em Salvador 2.884 veículos, contra 4.257 no mesmo período deste ano.
*nomes fictícios Colaborou Luana Ribeiro